Net 7 Mares

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     Da série DESTROÇOS LITERÁRIOS

CHEIRO DE POESIA

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... deviam fazer o mesmo que fiz: na dúvida de os seus filhotes não terem cheiro de poesia e, por isso, correndo o risco de terem as suas obras sequestradas pela comadre águia, corram logo à famigerada ave para pedir a ela que poupe os seus escritos. Afinal, nessa caixa de Pandora que é a Internet literária, há sempre alguma chance de as fábulas reaparecerem com final diferente.                                                                                                

 

    Vejo colegas poetas reclamando na Internet sobre furto de suas obras. Ora! Uma obra, como, por exemplo, uma obra literária, é sempre um filho querido, e todos têm razão em reclamar quando o seu rebento é surripiado; mas também deviam se prevenir. Por exemplo, fazer o que fiz: assim que fiquei sabendo das proezas da comadre águia, que sai Internet afora, furtando poemas para comê-los, corri a ela:

    — Olha, comadre águia, por favor, não comas os meu filhotes. Sei que a senhora anda papando os filhotes dos outros, mas queria pedir-te para livrar a cara dos meus.

    — Mas, compadre coruja, quando eu encontrar alguns, como vou saber que são teus? Eles têm cheiro de poesia? Se têm, estão livres do meu apetite. Detesto cheiro de poesia...

    — Comadre águia, os meus filhotes cheiram a poesia pura, e é muito fácil identificá-los. São os filhotes mais lindos do mundo. Todos bem arrumadinhos nas rimas e na métrica. Cada um tem uma historinha bonita! Ah, comadre águia! Meus filhotinhos são bem ritmados e muito eufônicos. A senhora não vai encontrar, entre os meus, por exemplo, esses bichinhos que só têm cabeça e duas pernas, e que o povo chama de hai-cai ou de poetrix; também não vai encontrar nenhum desarrumado, desses desengonçados que a gente vê, aos montes, por aí, e que choram à toa, berrando sem lágrimas. Os meus, quando choram, emocionam até mesmo a senhora, que tem coração duro. Não conheces os filhotes da comadre Lizete Abrahão?

    — Claro que conheço. Arghhh! Eca!!

    — E os filhotes das comadres e compadres Armando Figueiredo, Elane Tomich, Cristina Pires, Lílian Maial, Nathan de Castro, Ógui L. Mauri... Pois bem, os meus são bem parecidos.

    — Conheço todos esses, compadre, e nem chego perto, porque fedem a  poesia além da conta. Gosto mesmo é daqueles comuns, sempre parecidos no gosto... Sabe como é?

    — Sei não, comadre. Como assim?

    — Ah, compadre! Não é possível que o senhor não conheça... São aqueles que não têm aquele fechamento interessante que os bons poetas conhecem por chave-de-ouro, recurso que detesto ver. Ah! Esses, eu não perdoo; tomo logo de assalto. Vez em quando, encontro alguns que não tem fedor de poesia, mas têm cheiro pior, que ofende o paladar... Os do Lau Siqueira, por exemplo, têm esse cheiro abominável. Ah! Desses, eu não quero nem saber. Não fedem a poesia, mas são uns monstrengos, em que a gente fica tentando, sem sucesso, saber onde ficam a cabeça e as pernas. Como é que se pode comer uma iguaria esquisita sem saber por onde começar? Têm sim uma fedentina, algo parecido com cheiro de remédio pra piolho

        — Remédio pra piolho? Ah, já sei! São os poemas-cabeças. Esses, a senhora pode comer, que ninguém dará por falta. Segue um dos Lau, das suas 10 composições que estão publicadas no site da Revista Acrobata, em https://revistaacrobata.com.br/demetrios/poesia/10-poemas-de-lau-siqueira/. O texto desse é apenas um arranjo pueril descritivo que parece ter saído da cabeça de um infante. Os poemas-cabeças, quase sempre, são assim: apenas descritivos. Ei-lo: 

CONDIÇÃO PERENE

Lau Siqueira

               nas cheias
o rio comanda o espetáculo

e as margens são apenas
degraus para o leito mais fundo

               nas secas
               o rio é a margem

         Onde é que se pode ver poesia nesse desengonço? Passa a impressão de que, se demorasse mais um pouco na carpintaria da composição, a coisa acabaria num hai-cai.

        Há alguns anos, muitos poetaços internautas amparavam-se em vestimentas de gosto duvidoso, feitas no atelier do Sr. Power Point, para aparecerem melhor nas passarelas da Internet Literária. Hoje, tentam fazer os seus garranchos passarem por poemas, usando linhas quebradas, versos brancos (sem rima), metáforas sem sentido e construções amalucadas, com parágrafos de variados recuos e sem motivo algum para isso, conforme vemos acima. Se isso não basta, o prosador Lau dá ainda uma solene banana à pontuação, como se fosse um Saramago tupiniquim sem Nobel. No entanto, a julgar pelos comentários dos que caem lá na página do link declinado há pouco, mostrado mais acima, dá para perceber que há ainda quem aprecie as suas composições que ele chama de poemas.

        O Lau, por causa das críticas que andei fazendo à sua poética troncha, passou a odiar-me, tendo mesmo colocado o meu endereço de e-mail em bloqueio no seu correio virtual. O colega não consegue perceber que, quando emito opinião sobre as suas letras, com cópias para trocentos endereços de e-mail da Comunidade Literária, estou, na verdade, divulgando o seu trabalho, ainda que o colocando na posição de um Tristão de Athayde, também conhecido por Alceu de Amoroso Lima, aquele pensador católico que era alvo dos comentários depreciativos do Nelson Rodrigues. O que falta ao prosador pretensamente poético Lau na capacidade literária falta também no seu raciocínio conclusivo lógico. Todavia, por outro lado, o Lau — por tudo o que escrevi até aqui, não posso tratá-lo por poeta — não carece, pelo menos de minha parte, de propaganda alguma de suas obras, porque, além de já ter publicado 8 livros de (pasmem!) poemas, tem um currículo apreciável e fiéis admiradores. O José Geraldo Neres, do site Palavreiros, cujos textos estão mais para prosa do que para poema, era o meu favorito para figurar como o arcebispo Dom Helder Câmara, outro que também era fustigado pelo Nelson; mas tive que dispensá-lo, porque a sua reação à minha crítica azeda quase vira um abraço festivo, e pouco faltou para a sua resposta se transformar num convite a uma comemoração regada a um bom vinho. Ora! Na posição de Nelson, um Dom Helder tão afável como o Neres, não ficaria bem nos meus textos da série “Nelson Rodrigues Renascido”. Já o Lau, com os seus melindres descabidos, esse sim ficou ótimo na encarnação do Alceu. 

        — Então, o senhor coruja, diz, pelo menos, onde fica o ninho das tuas corujinhas, que eu vou lá só para conhecer. Prometo que não comerei nenhuma.

        — Repare bem, comadre águia: o ninho fica lá na árvore do Blogger, onde eu moro, no galho: http://net7mares.blogspot.com.br/2012/04/mar-da-alma.html

        — OK, compadre coruja. Fica tranquilo. Mas o senhor não tem, por agora, pelo menos unzinho que não cheire muito a poesia? É que acordei ainda há pouco e nem fiz o desjejum. Eu sei que, basta eu levantar vôo, e logo encontro comida, mas unzinho agora, só pra quebrar o jejum... O senhor tem?

    — Tenho esse aqui, comadre. Nasceu muito mirradinho. Como é novinho, ainda não tem cheiro de poesia. Sirva-se à vontade. Ele não vai durar muito mesmo...

    — Obrigado, compadre coruja. Tem um nome bonito: "Soneto Didático", mas... Humm! Tem, sim, um cheirinho de poesia, compadre. Pouco, mas tem. Mas, tudo bem. Para quebrar o jejum, serve. 

CHEIRO DE POESIA

                 Net 7 Mares       

Poeta, vê se desperta
E põe mais de tua atenção
Quando leres a lição
Da poesia mais certa.
 
Se é que existe inspiração
Descendo em tua mente,
Dize em versos o que sentes,
Mas, dize-o co'o coração.
 
Evitar o passo manco,
Rimar embaixo e em cima,
Já é boa melhoria,
 
Mas preciso ser-te franco:
Nem tudo, com metro e rima,
Tem cheiro de poesia.
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         Não sei se os meu filhotes têm cheiro de poesia, mas o pedido que fiz à  comadre águia deu certo. Ela não toca nos meus filhotes, o que me leva a fazer esta recomendação: esses que vivem fazendo queixas sobre furto de suas obras, deviam fazer o mesmo que fiz: na dúvida de os seus filhotes não terem cheiro de poesia e, por isso, correndo o risco de terem as suas obras sequestradas pela comadre águia, corram logo à famigerada ave para pedir a ela que poupe os seus escritos. Afinal, nessa caixa de Pandora que é a Internet literária, há sempre alguma chance de as fábulas reaparecerem com final diferente. 

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        LIVRE PARA COMPARTILHAMENTO.