A CONSTRUÇÃO DE UM POEMA – Parte 2



Da série “Um Técnico Aleijado”

A CONSTRUÇÃO DE UM POEMA – Parte 2
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... para o leitor, é difícil encontrar poesia (emocionar-se) na leitura de uma composição feita de versos brancos (sem rima), sem o ritmo da métrica e da tonicidade. A prosa poética, em suma, é um exercício egoístico, pois que atende apenas ao autor na busca por poesia. Por isso é que a prosa, em geral, é lírica, ou seja, fala apenas dos sentimentos do autor. Evidente que há exceções, mas são raras.


Errata: Na parte 1 (publicação anterior), o termo "entoação" foi corrigido para "tonicidade".

INTRODUÇÃO:
Nesta segunda parte, já tendo focalizado, na anterior, sobre o elemento chave-de-ouro, veremos agora os demais elementos que compõem um poema; e, para melhor entendimento, convém fazer aqui um rápido retrospecto sobre a 1ª parte. Antes, convém também lembrar que, ao final das 3 partes e respectivas sub-partes que compõem o presente estudo, os leitores, tendo entendido a mecânica da construção de um poema e seguindo os passos que serão demonstrados, possam também montar uma composição própria com melhor desembaraço. De resto, como se trata de um estudo algo complexo, serão usadas, neste estudo, palavras de fácil entendimento, evitando-se também aprofundamentos em aspectos da arte poética, os quais, para o que se pretende aqui, são dispensáveis.

Fechando esta introdução, reitero que não há, em mim, pretensão alguma de ensinar arte poética. Há apenas a honesta intenção de descrever a técnica que uso na composição dos meus poemas, na esperança de que a mesma possa ser aplicada por aqueles que enfrentam dificuldade para pôr uma inspiração no formato de um poema.

RETROSPECTO
No artigo anterior (1ª parte), vimos então que...

a) — Uma composição poética — principalmente em se tratando de um soneto — é composta dos seguintes elemento: chave-de-ouro, rimas, métrica, tonicidade e metáfora.

b) — Considerando que um poema é uma história resumida, a chave-de-ouro figura, dentre esses elemento, como o principal, porque constitui o que podemos chamar, em linguagem popular, de "moral da história". Por aí, podemos dizer que um poema sem chave-de-ouro é como uma história sem final, ou uma descrição apenas.

c) — A finalidade de um poema é levar o leitor a um certo nível de emoção que culmine em riso ou lágrimas. Neste aspecto, o poema pode ser comparado à arte da representação (teatro), cujo símbolo é aquele ícone composto de duas máscaras (uma rindo, e outra chorando).

d) — Para alcançar esse objetivo, o poeta insere, na sua composição, os elementos citados na letra "a", que o ajudam na tarefa de emocionar o leitor. Quanto mais e melhor usar aqueles elementos, maior será a  possibilidade de alcançar o seu objetivo.

Os que compõem as chamadas prosas poéticas usam, no geral, apenas dois daqueles elementos, que são a metáfora e a chave-de-ouro, sendo que, na esmagadora maioria, só usam a primeira. Não usam os demais elementos, ou porque não os dominam, ou por causa da preguiça em aprender. Por isso, é fácil compor prosa poética; mas, para o leitor, é difícil encontrar poesia (emocionar-se) na leitura de uma composição feita de versos brancos (sem rima), sem o ritmo da métrica e da tonicidade. A prosa poética, em suma, é um exercício egoístico, pois que atende apenas ao autor na busca por poesia. Por isso é que a prosa, em geral, é lírica, ou seja, fala apenas dos sentimentos do autor. Evidente que há exceções, mas são raras.

Para que possamos entrar na técnica de montagem de um poema, precisamos, antes, conhecer os seu elementos ainda que superficialmente. É necessário também recordar sobre acentuação tônica das palavras (proparoxítonas, paroxítonas e oxítonas):

PROPAROXÍTONAS: a sílaba mais forte — aquela em que demoramos mais na pronúncia — é a antepenúltima: hábito, ótimo, estúpido, etc.

PAROXÍTONAS: idem, penúltima sílaba: poeta, abrigo, escola, etc.

OXÍTONAS: idem, última sílaba: paixão, não, João, além, aqui, etc.

Agora, sim, podemos ver o primeiro dos elementos de um poema:

Parte 2A: RIMA

Considerando somente a sua estrutura visual, um poema é um conjunto de linhas escritas, e cada uma dessas linhas é chamada de verso. A rima nada mais é que uma similaridade fonética entre as sílabas tônicas finais que aparecem respectivamente nas palavras que figuram no fim de cada verso da composição. A rima pode aparecer nos seguintes formatos, segundo as diversas posições que ocupam numa estrofe (conjunto de versos). Para prevenir queixas sobre direitos autorais, os exemplos foram colhidos na minha coletânea. Observe que, nas rimas, estão incluídas as respectivas  vogais (ou grupos vocálicos) da sílaba tônica (mais forte) da última palavra do verso

a) — Cruzada ou Alternada: a-b-a-b

A poesia que eu faço
Traz escrito no estandarte:
"Abram alas! Quero espaço
Pra levar, a todos, arte.
(ODE À RIMA E À MÉTRICA)

b) — Interpolada ou Intercalada: a-b-b-a

E, no teste, a tua exigência
De amar sob condição...
Não, querida, não amas não;
Teu amor é conveniência.
(AMOR E APARÊNCIA)

c) — Emparelhada: a-a-b-b

Preciso já duma graça
que peço por merecer,
Senão, vou enlouquecer
Diante dessa desgraça
De, por mais força que eu faça,
Não conseguir te esquecer.
(PEDIDO)

d) — Misturadas: aparecem no poema, sem ordem ou regularidade.


Odigo, cabra safado,
Que fizeste com o arquivo?
O arquivo "suco_fruta"
Que mandei, esperançado...
Preparei com tanta luta,
E você, filho da puta,
Com cara de prestativo,
Pega o meu arquivo e some.
Minha musa, tão tristonha,
Se acabando em sede e fome;
E tu, com o ato lesivo,
Me matando de vergonha.
(ODIGO E O SUCO)

Quanto ao aspecto de qualidade, as rimas classificam-se em pobres e ricas:

RIMA POBRE: é aquela que acontece entre palavras de mesma classe gramatical, ou seja: substantivo rimando com substantivo; verbo com verbo; adjetivo com adjetivo; etc. São pobres também as rimas em palavras oxítonas de uso comum que terminam em "ão", "or" e "ar".

As rimas pobres conferem um ar de banalidade à composição e, por isso, devem ser evitadas ou, pelo menos, usadas com boa dose de comedimento, já que evitá-las de todo é quase uma impossibilidade.  Esse cuidado deve ser redobrado para os que pretendem inscrever suas obras em concursos literário, vez que as bancas julgadoras costumam ser rigorosas com esse quesito.

Exemplo:

É gente que desconhece (verbo)
Que'alma vive de poemas (substantivo)
Bem rimados nos fonemas, (substantivo)
Onde a emoção floresce. (verbo)
(CARTA À MUSA)


RIMA RICA: é aquela que não se enquadra nas circunstâncias apontadas nas rimas pobres.

EXEMPLO

E, por não servir pra nada,
A pobre escada sofria
Num caracol de agonia,
Até ver-se reparada
De sua dor, ao ser galgada
Pelos passos da poesia.
(ESCADA POÉTICA)

Cabe, por fim, acrescentar a esta parte do estudo o recurso do CAVALGAMENTO (ou "enjambement"), que consiste em dividir uma frase completa, pondo-se parte da frase num verso, e a parte restante no verso que se segue. Trata-se de recurso valioso, seja para manter o rigor da métrica, seja para montar rima rica.

EXEMPLO:

Preencher com volúpia os cantos e espaços
Do teu corpo
, a fazer-te minha meretriz;
Ler nos teu olhos o que a boca não diz;
Romper teus tabus, desatar-te dos laços
(FLOR-DE-LIS)

Na próxima publicação (Parte 2B), veremos um breve estudo sobre métrica.

A Parte 1 (publicação anterior) deste estudo está publicado no meu blog, em

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